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Depois de passar por um mês de derrotas no Congresso, com uma revolta do PMDB e de outros partidos da base aliada que causou a rejeição de um aliado para a direção da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) e o adiamento da votação da Lei Geral da Copa, a presidente Dilma Rousseff disse que o governo não passa por uma crise institucional. Em entrevista à revista “Veja” desta semana, ela afirmou que as tensões com o Congresso são normais.
"Não há crise nenhuma. Perder ou ganhar votações faz parte do processo democrático e deve ser respeitado. Crise existe quando você perde a legitimidade. Você não tem de ganhar todas. O parlamento não pode ser visto asim. Em alguma circunstância, vai sempre emergir uma posição do consenso do Congresso que não necessariamente será a do Executivo. Isso faz parte do processo", afirmou a presidente, que ainda citou como exemplo a maior derrota do governo Lula no Congresso.
"No governo passado perdemos a votação da CPMF e o céu não caiu sobre a nossa cabeça", disse.
Ainda sobre as derrotas no Congresso, Dilma disse que a troca de líderes não teve a ver com a tensão entre o governo e a base aliada.
"Não gosto desse negócio de toma lá dá cá. Não gosto e não vou deixar que isso aconteça no meu governo. Mas isso nada tem a ver com a troca dos líderes. Eles não saíram por essa razão", disse, lembrando que a tensão existente no momento é natural em ano de eleições municipais.
Dilma também rebateu o discurso do ex-presidente Fernando Collor de Mello, que afirmou ter perdido o cargo quando perdeu sustentação no Congresso. Segundo ela, as crises institucionais no Brasil não ocorreram por questões pequenas, mas sim por perda de legitimidade do governante.
De acordo com a presidente, a demissão em série de ministros em seu primeiro ano de governo serviu para mostrar que o governo não dará "espaço para a fraqueza dos indivíduos".
"Nenhuma pessoa que é chamada para o governo pode achar que haverá algum tipo de complacência. Nós temos de ser o mais avesso possível aos malfeitos. Não vou transigir", disse, lembrando que nem todos os ministros que deixaram o governo saíram por estar envolvidos com irregularidade.
"Alguns pediram para sair para evitar a superexposição ou para se defender das acusações que tiveram".
A presidente criticou o tratamento do desligamento de ministros como uma faxina ética.
"Parece preconceituoso. Se o presidente fosse um homem vocês falariam em faxina?", questionou.
Dilma disse que quer ser lembrada pela profissionalização do governo.
"Não dá para consertar a máquina administrativa federal de uma vez, sem correr o risco de um colapso. Nem na iniciativa privada isso é possível. No tempo que terei na Presidência vou fazer a minha parte, que é dotar o Estado de processos transparentes em que as melhores práticas sejam identificadas e adotadas mais amplamente. Esse será meu legado", afirmou.
Segundo Dilma, suceder a um político popular como Lula foi muito fácil, por causa da experiência que teve como ministra da Casa Civil. Ela disse que tem profunda admiração por seu padrinho político, mas que nem sempre concorda em tudo.
"Discordamos sim. Isso é normal. Mas, no que é essencial, nós sempre concordamos”, declarou.
Economia: Dilma defende política cambial
Na entrevista, Dilma se defendeu dos críticos que classificam a política cambial brasileira de protecionista, em entrevista concedida à revista “Veja” desta semana. Ela vê as medidas adotadas pelo Brasil como uma forma de defesa em função do tsunami de liquidez criado pelos países ricos.
“O protecionismo é uma maneira permanente de ver o mundo exterior como hostil, o que leva ao fechamento da economia. Isso não faremos”, afirmou a presidente, recordando a experiência mal-sucedida dos anos 1980 que privou o parque industrial brasileiro de modernização e tecnologias essenciais.
“O que estamos fazendo, e vamos contiuar fazendo, é contrabalançar com medidas defensivas as pressões desestabilizadoras externas que estão carreando para o Brasil quantidades excessivas de capital especulativo”, afirmou a presidente.
Segundo ela, essas medidas vão ser revogadas quando o panorama externo mudar para melhor.
Essa foi uma das considerações que Dilma revelou ter feito para a chanceler alemã, Angela Merkel, durante encontro na cidade de Hannover, na Alemanha, no início do mês.
“Eu quis deixar claro que o Brasil não quer mais ser visto como destinação de capital especulativo ou apenas como mercado consumidor dos produtos que eles exportam”, declarou.
Dilma disse que a intenção do governo é se “defender atacando”. Essa foi uma das tônicas da conversa que teve na quinta-feira com 28 empresários brasileiros, onde mais uma falou que irá proteger o mercado interno da especulação financeira e da concorrência desleal.
“Eu disse a eles (os empresários com que se reuniu na quinta-feira) que a nossa maior defesa é aumentar a taxa de investimento privado” afirmou a presidente.
Ela reconheceu que é preciso reduzir a carga tributária e afirmou que vai diminuir os impostos. Mas também cobrou dos empresários mais investimentos e a tomada de mais riscos.
“Os empresários terão de fazer a parte deles, aproveitar as oportunidades, assumir riscos e deixar aflorar aquilo que o Keynes chama de "instinto animal" da livre-iniciativa”, afirmou.
O Globo
ENTREVISTA - 13/01/2025